O rabo da raposa

A história da vez é a do rabo da raposa

Esta fábula conta como a raposa perdeu o rabo e o que teve que fazer para recuperá-lo — deu um trabalhão!

Ela lembra lenga-lengas como a da “Velha a fiar”, da qual me lembro da minha infância, ou a do “Rato”, de infâncias mais recentes 😊.

Boa leitura!

Eu me lembro de um dia, quando criança, em que vi minha avó, que era costureira, cumprimentar uma raposa que descia a rua com passos apressados e um ar profissional, bem elegante, que tirou o chapéu respeitosamente devolvendo o cumprimento de minha avó.

Perguntei-lhe de onde ela conhecia a raposa e ela me contou a história do dia em que a conheceu.

E era assim:

Havia, há muito tempo atrás, uma fazenda na curva do rio onde vivia uma velha e seus netos. Ela criava cabras e vivia de fazer queijos. Ela era uma pastora muito hábil e cuidadosa, e suas cabras produziam o melhor leite da região. E aquele leite, de tão perfumado, um certo dia atraiu uma raposa muito astuta que rondava por ali.

A raposa passou a beber aquele leite todas as noites. A senhora pastoreava, alimentava, limpava e ordenhava as cabras — só para, a cada dia, encontrar menos leite do que no dia anterior.

“Ora bolas! Algum ladrão anda roubando meu leite”, pensou a velhinha, que, então, decidiu se esconder para flagrar quem andava bebendo o leite de suas cabras.

À noite, a raposa apareceu, como sempre, e pôs-se a beber. A velha, furiosa, pegou um tição quente no fogão e — lau! Cortou o rabo da raposa com um único golpe.

A raposa gritou de susto e rolou pelo chão. “Aiaiaiaiai, senhora, uiuiuiuiui! Por favor, senhora, devolva-me o rabo!”, gritou a raposa ladina.

“Só devolvo se você me devolver todo o leite que roubou!”, respondeu-lhe a velhinha, que sabia ser maldosa quando brava.

A raposa, sem rabo, engoliu a vaidade e foi até as cabras pedir-lhes um pouco de leite para levar à pastora. “Caras cabrinhas, ajudem um amigo em necessidade, por favor! A pastora arrancou-me o rabo e preciso de leite para recuperá-lo! Vocês podem ceder um balde ou dois para mim?”

As cabras entreolharam-se com seus olhos estranhos e a mais velha encarou a raposa e disse: “Muito bem, irmão raposa, podemos dar-lhe um pouco de leite; porém, queremos que você nos faça algo em troca. Ali há uma árvore com folhas muito saborosas que não conseguimos alcançar. Vá até lá e nos traga um maço daquelas folhas para comer e terá o seu leite!”

“Mééé!” apoiaram-na suas companheiras, e voltaram a mascar o que quer que estivessem comendo.

A raposa, cambaleando (pois era difícil equilibrar-se sem o rabo), foi até a árvore e rogou-lhe:

“Frondosa árvore, peço-lhe um favor: dê-me um maço de suas folhas para minhas amigas cabras comerem, por favor!”

A árvore bocejou longamente, olhando a raposa de cima, e respondeu-lhe que sim, claro, que ela poderia ter um maço de folhas, desde que lhe trouxesse água fresca do poço.

A raposa foi até o poço e rogou-lhe, “Admirável ancião, poço venerável! Por favor, dê-me um balde de água para eu molhar a terra ao pé da árvore!”

O poço sorriu e respondeu que sim, claro, que a raposa podia pegar quanta água quisesse; porém, que há alguns dias haviam levado seu balde e que para dar água à raposa, ele precisava que ela lhe trouxesse um balde.

A raposa foi ao marceneiro e contou-lhe o que precisava. O marceneiro disse-lhe que lhe trouxesse madeira. Então, ela foi ao lenhador, que lhe pediu feijão. Ela foi ao agricultor, que precisava de sapatos e ao sapateiro que queria pregos, e ao merceeiro que precisava de alguém para caçar os ratos, e aos gatos que queriam peixe, e ao peixeiro que queria um avental, e à costureira que queria ouvir uma história. Então, ela contou sua própria história — que era esta — à costureira ― que era a minha avó ―, que retribuiu a história dando-lhe um avental, que a raposa levou ao peixeiro, que lhe deu peixes, que ela levou para os gatos, que caçaram os ratos do merceeiro, que, satisfeito, deu-lhe os pregos, que ela levou para o sapateiro, que lhe deu sapatos, que ela levou ao agricultor, que lhe deu feijões, que ela levou ao lenhador, que lhe deu madeira, que ela deu ao marceneiro, que lhe deu um balde, que ela usou no poço, levando a água para a árvore que deixou que ela colhesse suas folhas, que ela trocou por leite com a cabras.

Por fim, ela apareceu de novo na casa da velha, desta vez com dois baldes de leite, cansada, humilde, desculpando-se e pedindo seu rabo de volta.

E a velha devolveu-lhe o rabo e costurou-o de volta no seu bumbum, dizendo: “Espero que tenha aprendido! Você achou que roubar era fácil?”

Fonte

The Fox’s Tail, publicado pelo al-hakawati Arab Cultural Trust, disponível em: http://al-hakawati.net/en_stories/StoryDetails/2601/The-Foxrsquo;s-Tail.

Crédito da imagem de capa

The fox who lost his tail. Engraving: J.D. Cooper, 1883 https://www.northcountrypublicradio.org/news/story/35109/20171128/story-traveler-the-fox-s-tail